Localizada em um pedaço do Alentejo quase esquecido pelo tempo, um projeto vinícola especial vem ganhando vida. Essa iniciativa, que se dedica ao cultivo de castas quase extintas e ao resgate de métodos de cultivo tradicionais, busca a harmonia entre vinhedos e natureza, sem abrir mão da autenticidade alentejana. Um pedaço do Alentejo que ninguém conhecia, destaca a dedicação em manter vivas as castas locais e os ensinamentos transmitidos ao longo de gerações.
O projeto começou com a restauração de um edifício histórico praticamente em ruínas: o Paço do Morgado de Oliveira, uma casa fortificada datada do século XIV, de 1390.
A Fitapreta, vinícola alentejana fundada em 2004, tem conquistado reconhecimento pela qualidade de seus vinhos e pelo compromisso com a autenticidade.
Apesar de operar inicialmente em instalações alugadas e com vinhas arrendadas, o projeto cresceu e se consolidou, culminando na aquisição de uma sede própria em 2016. A compra do edifício em 22 de dezembro de 2016 marcou um novo capítulo para a empresa, que, até então, dependia de vinhedos alugados e instalações temporárias.
A propriedade de 130 hectares inclui 30 hectares de vinhedos e áreas de montado, além de outras culturas. Na reestruturação, a equipe se dedicou a preservar os ecossistemas originais, mantendo árvores e pedras no mesmo local e construindo abrigos para aves de rapina, corujas e morcegos, contribuindo para o equilíbrio ambiental.
Um passo importante na independência produtiva foi dado em 2017, quando a Fitapreta plantou a sua primeira vinha no Morgado de Oliveira. Já em 2018, a empresa adquiriu a icônica vinha do Chão dos Eremitas, localizada no sopé da Serra d’Ossa, de onde vem a casta Tinta Carvalha, símbolo da vinícola e do terroir alentejano.
Com uma trajetória marcada por crescimento e compromisso com a viticultura alentejana, a Fitapreta continua a investir na sua estrutura e na formação de uma equipe dedicada, consolidando-se como uma referência de qualidade e inovação no mercado de vinhos em Portugal.
Um Projeto Idealizado por Jovens Visionários
O projeto é fruto da visão e persistência da parceria entre António Maçanita, engenheiro e enólogo renomado, e o viticultor David Booth. Maçanita com 24 anos na época e experiência em vinícolas da Califórnia, Austrália e Bordeaux, retornou a Portugal com a ambição de criar vinhos autênticos. Sem herança de vinhedos ou adega, começou arrendando pequenas parcelas para plantar uvas indígenas portuguesas, com foco em castas tradicionais alentejanas. Com a ajuda de amigos e familiares, conseguiram lançar o projeto, que já celebra 20 anos de produção. A enóloga Sandra Sárria, sócia da vinícola, também desempenha um papel central na produção junto com Maçanita.
A Fitapreta ainda conta com uma equipe de cinco enólogos residentes: Patrícia Nunes, Jéssica Mesquita, Pedra Adegas, Maria Madalena Borges e Maria Margarida Borges. Todos contribuem com sua expertise para garantir a qualidade e originalidade dos vinhos.
André Alves, diretor operacional do enoturismo, é responsável por recepcionar os grupos e guiar os visitantes em uma experiência completa.
No setor de enoturismo, a empresa conta com uma equipe de 12 profissionais para receber e organizar atividades para os visitantes. À frente desse departamento está Alexandra Leroy Maçanita, responsável por proporcionar uma experiência autêntica e imersiva a quem visita a Fitapreta.
A Sustentabilidade da Fitapreta
O respeito pela terra é uma prioridade no Paço do Morgado de Oliveira. Desde o início, os responsáveis pelo projeto decidiram não interferir nos ecossistemas existentes. Para proteger o vinhedo de pragas, abrigos foram instalados para acolher predadores naturais, como aves e morcegos, evitando o uso de pesticidas. Além do vinho, a propriedade produz azeite com oliveiras locais e até mel, ampliando o compromisso com a sustentabilidade e o aproveitamento integral dos recursos naturais.
Resgate de Castas Ancestrais
Além do compromisso ambiental, o projeto busca trazer de volta o sabor dos vinhos ancestrais da região. Estudos históricos indicam que, na propriedade, produzem-se vinhos desde o século XIX. Recentemente, um vinho especial foi lançado em homenagem a essa tradição, seguindo notas de degustação documentadas em registros históricos de 1857. A linha inclui castas tradicionais como trincadeiras e roupeiros, em uma busca pela autenticidade dos sabores.
A equipe do Paço do Morgado de Oliveira celebra, atualmente, duas décadas de sucesso e tradição renovada, trabalhando para preservar a história e o meio ambiente. Com as técnicas e infraestrutura desenvolvidas, o projeto se tornou um símbolo de renascimento para o Alentejo, unindo passado e futuro em cada garrafa produzida.
A Prova de Vinhos Dinâmica
Tiago Sobral, arquiteto do projeto da loja, mesclou o antigo com o atual, mantendo ferros pretos, madeira e vidros, entre paredes históricas. Para aguçar a compra das 300 mil garrafas produzidas anualmente.
A degustação começa com uma prova dinâmica de vinhos, onde os visitantes são apresentados a alguns dos principais rótulos da vinícola, cada um servido em um ambiente específico, explorando arquitetura, história e vinhos de modo inusitado e imersivo. No primeiro ambiente o Fitapreta Branco – O Ancestral é servido no Wine Bar da Fitapreta. A Trincadeira das Pratas – Chão dos Eremitas é servido na Adega do Enxarrama e o Baga ao Sol disponível na Adega de Brancoa abre o apetite e convida a sentar-se à mesa para uma experiência mais completa ao paladar.
O Chef Afonso Dantas
Após a prova de vinhos, a experiência se expande para uma degustação gastronômica elaborada pelo jovem chef madeirense Afonso Dantas, que interpreta os sabores do Alentejo de maneira contemporânea e surpreendente. A refeição, realizada na tribuna da capela, é dividida em cinco momentos, cada um harmonizado com um vinho distinto.
No primeiro momento os snacks iniciais, o prato é o Tártaro de lúcio-perca com tangor, torricado de veado com óleo de barrica e coscorões de massa mãe com borrego, na taça o espumante Fitapreta Rosé NV.
Esse primeiro momento oferece uma introdução leve e sofisticada, onde os sabores de peixes e carnes são acompanhados pelo frescor do espumante rosé, elevando os aromas e realçando a textura dos snacks.
No segundo momento o Pregado com Toques Alentejanos, que, na prática, é o pregado com funcho, beurre blanc de ovelha e figueira, na taça o Morgado Oliveira NV, destacando as características herbáceas e levemente frutadas do vinho.
No terceiro momento Dantas recria o prato mais popular do Alentejo, o Cachaço de Porco Preto, que leva cogumelos e jus de porco com mostarda, um espetáculo à parte acompanhado pelo deslumbre do vinho Preta 2021.
A sofisticação do quarto momento é de fazer o cliente beijar o solo abençoado alentejano com a magnífica sobremesa de Laranja, Mel e Açafrão, fechando com chaves de selenita laranja para representar a energia, criatividade, entusiasmo, alegria e vitalidade do chef Afonso Dantas, a sobremesa à base de laranja é acompanhada pelo vinho Laranja Mecânica NV, uma combinação que explora o contraste entre doçura e acidez, trazendo frescor e vivacidade ao paladar.
O vinho laranja é feito a partir de uvas-brancas submetidas a um processo especial de vinificação, onde a segunda e terceira prensagem das uvas, que possuem mais contato com as cascas, resultam em maior concentração e maceração, dando uma cor e riqueza distintivas. Esse método traz complexidade e corpo ao vinho, tornando-o semelhante aos vinhos históricos preferidos pela nobreza devido à sua cor e densidade.
Ainda há um quinto momento, quase bíblico o Pão e o Vinho, para comer com os olhos e beber a Tinta Carvalha 2022, um espetáculo.
A experiência é personalizada por grupo, então nem sempre serão servidos os mesmos vinhos e o mesmo menu.
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O nome Fitapreta
O nome Fitapreta veio de um apelido de uma família amiga dos Açores. O pai de António Maçanita é de São Miguel, e ele passava férias lá, onde visitava a casa dos Fitapreta, uma família conhecida por um ancestral que usava uma fita preta no rosto. O nome ficou marcado para Maçanita por ser impactante e fácil de lembrar. Quando ele e David Booth fundaram a empresa, decidiram adotar esse nome após várias sessões de brainstorming, pois ainda não tinham adega, vinha ou quinta. O logo da marca é formado pelos perfis dos dois fundadores.